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S. Domingos ganha mais vida com a “febre” da Nacional 2

8/09/2020 às 00:00
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Mural de São Tiago do artista Francisco Camilo

Quem faz a Estrada Nacional 2 atual pode passar ao lado de um percurso que tem história porque, seguramente, tem muitas histórias para contar. O percurso original da Nacional 2, aquela estrada que está na moda, permite circular entre Vila de Rei e a entrada de Abrantes por uma via que não é a atual, que pode ser desenhada por qualquer coordenada de GPS.

A antiga passa pelo km 369, o meio da EN 2 que fica “ali trás dos rails” entre Vila de Rei e o Penedo Furado.

Haverá de ter um marco bem grande e diferenciador para assinalar o meio da estrada. É essa a ideia da Câmara Municipal de Vila de Rei.

Km 369, o meio da Nacional 2, em Vila de Rei

Mas quem segue por ali poderá parar no miradouro do Penedo Furado. Mesmo que não desça à praia fluvial pode apreciar as paisagens do pinhal, apesar de dizimadas pelos fogos de 2017, têm a sua marca. Pode ver uma pedra no topo de uma colina e imaginar como está ali, ou ver um dos braços da albufeira do Castelo de Bode, ou simplesmente pensar que daqui a uns tempos pode descer a íngreme encosta entre o miradouro e os passadiços do Penedo Furado para poder ver a cascata ou para conhecer a lenda da Bezerra Dourada.

Depois pode seguir e passar pelo Brescôvo, pela Salgueira e entrar em S. Domingos.

E nesta pequena localidade dividida entre dois concelhos pela EN 2 há uma nova vida que está a fazer renascer a aldeia que está encrostada entre Carvalhal e Santiago de Montalegre. Entre Abrantes e Sardoal.

E pode mesmo ter de parar o carro no concelho de Sardoal para atravessar a estrada e ir beber uma água ao concelho de Abrantes.

S. Domingos já foi uma aldeia próspera. Nos idos anos 50 e 60 tinha mercearias, tabernas e até um barbeiro.

Pedro Rosa, vereador da Câmara de Sardoal, é daquelas bandas. Recorda as histórias dos familiares de um S. Domingos cheio de vida. A Nacional 2 era a estrada de acesso das beiras a Abrantes, à estação dos Caminhos de Ferro de Alferrarede. Só por isso, noutros tempos, já se percebe o tráfego comercial que se fazia por ali.

Era ponto de passagem de carreiras da rodoviária e até ponto de partida de outras. “Até tinha um campo de futebol” como a generalidade das aldeias. Das alturas em que havia jovens para dar uns pontapés na bola.

Pedro Rosa lembra-se do trânsito porque era por ali que passava os verões, numa bicicleta. Eram frequentes as idas ao Penedo Furado e depois as subidas de regresso a S. Domingos e a Santiago de Montalegre.

Hoje há menos carros, menos bicicletas, mas seguramente mais motas. Os motards, ao longo dos anos, têm percorrido a antiga nacional. E Cláudia Luís, uma são dominguense por afinidade assume com o Francisco o topo da pirâmide de uma cadeia local que está a dinamizar a terra.

As coisas melhoraram muito com o Penedo Furado e com a praia fluvial de Fontes: “É por aqui que passam os turistas que procuram estes dois pontos refrescantes do verão”. O trânsito aumentou e os clientes dos dois cafés da terra também.

Km 380 em S. Domingos

Mesmo antes da “febre” da Nacional 2 diz que sempre “cuidamos do marco do km 380, o nosso de S. Domingos. É o nosso monumento. Sempre esteve cuidado e pintado. Sempre cortámos as ervas” diz enquanto aponta para as paredes do Café Bernardino que mais parece um “santuário da Nacional 2” tal a quantidade de movidos alusivos à estrada.

A Cláudia não é a dona do café. Esse tem duas sócias: Sónia Frade e Mila Passarinho. Mas quando se fala da estrada são elas que, de forma muito simpática, diga-se, apontam logo à Cláudia que, com o Alexandre Batista, tem tentando dinamizar a aldeia.

Café Bernardino "cheio" de Nacional 2

E como é que se faz isso numa aldeia envelhecida e com pouca população? É simples, diz Cláudia. Quanto ao marco “sempre o entendi como património e tenho sido eu a tratar dele em grande parte”. Aliás, como forma de poder ser mais apelativa a passagem por S. Domingos diz ter colocado as setas a indicar as direções de algumas cidades do mundo. “É mais apelativo e as pessoas param e tiram muitas fotos” e, desta forma, o marco não passa despercebido.

E sempre teve um “carinho” especial pelo marco porque “sempre ouvi as histórias dos mais velhos que diziam que a aldeia cresceu à volta desta estrada, dos camionistas que passavam e paravam”.

Em S. Domingos perto do marco do Km 380 estão as direções do "mundo"

Quando à mítica Nacional 2 Cláudia Luís lamenta a falta de sinalização turística que indique que esta é a estrada real, como existe, por exemplo na barragem da Aguieira. “Aqui foi desclassificada para trezentos e noventa e tal... e a antiga variante é que passou a ser a Nacional 2”

Agora, há uma ideia. Melhor, duas ideias.

A Cláudia acha que as coisas na terra podem melhorar ainda mais e fazer passar por S. Domingos mais pessoas. E fazer com que parem. Assim teve a ideia de fazer dois murais, que é como quem diz, duas pinturas em duas paredes.

Para isso fizeram-se rifas. Fizerem-se outros pequenos brindes alusivos à estrada por forma a poderem arranjar dinheiro para esses murais. No final de agosto um estava programado.

Francisco Camilo é o artista que tem andando por S. Domingos nos últimos dias a pintar a parede. Não com a cal branca que as Câmaras costumam dar aos munícipes, mas com tintas de cores bem vivas.

Cláudia diz com orgulho que a primeira escolha foi fazer uma pintura gigante com o padroeiro de Santiago de Montalegre: São Tiago.

 A Cláudia e o Alexandre querem dinamizar S. Domingos para chamar mais pessoas à aldeia

O segundo mural também está pensado. Cláudia Luís não adianta muito, mas sempre diz que terá algo a ver com os costumes e tradições da Aldeia de S. Domingos. E explica que a Nacional 2 é, nuns largos metros, até ao cruzamento onde se escolhe Andreus ou Carvalhal, a divisória dos dois concelhos.

É que nas nossas histórias esta é sempre uma das terras em que podemos dizer que parámos o carro em Sardoal e fomos tomar uma água a Abrantes ou então que tirámos uma foto nas setas “do mundo” que estão no Sardoal, mas o fotógrafo estava em Abrantes.

Ou agora tem sempre a possibilidade de passar ali por S. Domingos e, de olhos bem abertos, poder apreciar o marco do quilometro 380 da Nacional 2, o poste das setas do mundo ou o mural do São Tiago. E com estas pequenas coisas a Nacional 2 vai devolvendo alguma vida a S. Domingos. Alguma da vida que lhe tirou quando deixou de ser a ligação entre de Abrantes / Sardoal a Vila de Rei.

A Nacional 2 atravessa S. Domingos e é, ali, a fronteira entre Abrantes e Sardoal (Fotos: Googlemaps)

Reportagem: Jerónimo Belo Jorge

Fotografias: Taras Dudnyk