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Sociedade

CELESTE SIMÃO: A professora do primeiro ciclo que quase foi professora de ginástica

22/04/2019 às 00:00
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Celeste Simão

Nasceu e cresceu na vila ribatejana da Golegã. Foi por ali, pelas calmas ruas da vila que brincou com os colegas. “A minha mãe conta que eu ia buscar as cadeiras e, na rua, colocava-as toda sem fila, sentava as outras crianças. Eu era sempre a professora”. A recordação provoca uma onda de nostalgia e de outras recordações que, muitas vezes até estão ali guardadas numa gaveta. Da infância Celeste Simão recorda ainda as outras brincadeiras, quando costurava ou quando, já em adolescente, corria pelas lezírias ribatejanas.

Aliás, é dessas “correrias” e outras actividades físicas de ar livre e “no meio da rua” que saiu, na altura, a atleta e a jovem que ao concorrer à universidade quase foi uma professora de ginástica. Só os tempos na natação impediram a jovem goleganense de seguir para uma carreira ligada ao desporto. Depois de um ano sabático pensou “não é professora de ginástica que quero ser, mas quero ser professora”. Como em criança brincava aos professores e alunos, talvez tenha sido daí a veia de seguir depois o magistério primário e de ter feito o curso como professora do ensino primário, actividade profissional que exerceu, em diversos projectos, antes de ter entrado na política e de ter sido eleita vereadora da Câmara Municipal de Abrantes onde tem, entre outros, pelouros da educação e accção social. De resto, duas áreas que sempre dominaram a sua vida. Apesar de ser professora primária, a não colocação nos dois primeiros anos de trabalho levou-a a poder leccionar, curiosamente, educação física nas escolas de Tramagal e Golegã. E essa experiência acabou por confirmar que não seria aquela a sua vida, ou seja, ainda bem que não conseguiu entrar para o curso de Educação Física.

“Apesar de terem sido tempos difíceis, e eu sou filha de um casal de gente trabalhadora, ouvir a música ‘Somos Livres’ faz-me lembrar coisas que estavam guardadas” explica a professora que acrescenta “tudo o que passei e vivi fazem-me ser o que eu sou hoje”, com estas ligações à comunidade e à sociedade. Afirmou que são valores que vão sendo absorvidos e apurados.

Ainda no campo das recordações, uma dessas memórias vai para as visitas de governantes e gente importante à vila da Golegã: “Havia sempre a oferta de um ramo de flores a essas pessoas e era a minha mãe que fazia esses ramos. Fui habituada a ver isto

Depois da formatura foi professora do ensino primário em muitas localidades: “Sardoal, sabia lá onde era o Sardoal”. Gavião, Ponte de Sor, Mora, Abrantes foram outras localidades em que deu aulas. Foi docente do ensino de adultos, numa fase em que em Portugal se apostou em acabar com o analfabetismo e existiu uma rede de ensino para os adultos.

Celeste Simão acabou depois por abraçar outro projecto, já na primeira década de 2000, com o PIEF, um programa que visava o ensino de jovens problemáticos. “Tínhamos os professores das disciplinas, mas também professores primários, porque estes jovens tinham histórias de vida muito complicadas e era preciso, nalguns casos, os ensinamentos primários mesmo”, disse Celeste Simão, vincando que “eram jovens divididos entre as ruas e outras coisas. Andavam desnorteados e por vezes eram os professores que os aconselhavam”. É uma época que recorda com tristeza, não porque o trabalho tivesse corrido mal, mas porque “não conseguimos encaminhar todos os jovens que tentámos ajudar e alguns ainda não por aí, em caminhos não muito direitos”.

Celeste Simão revelou que estes jovens traziam histórias de vida que obrigava a tratar cada um de uma maneira diferente e só depois de muita confiança, quando eles se abriam “pensava que estava a ouvir a história vinda de um filme”. Estes anos de trabalho com estes jovens leva a uma receita que não existe porque tem de se trabalhar com eles de formas diferentes do que vem escrito nos manuais. “Eu acho que algumas vezes nem dormia, tais as histórias que ouvia destes jovens” salientou Celeste Simão afirmando que só uma família como a que tem permitiu ter tido estas actividades.

Celeste Simão, apesar de professora chega mesmo a considerar que tem um pouco de “psicologia” porque o saber ouvir e a diplomacia fazem parte da sua vida desde sempre, desde os tempos da Golegã até agora, em Abrantes.

Jerónimo Belo Jorge