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Região

Baixo caudal do Tejo continua a afetar culturas entre Abrantes e Constância - agricultores

20/08/2021 às 07:54
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O presidente da Associação de Agricultores de Abrantes, Constância, Sardoal e Mação disse hoje à Lusa que os fracos caudais do rio Tejo, controlados na barragem de Alcântara, em Espanha, continuam a afetar culturas e a provocar elevadas perdas.

“Nos últimos 15 dias, a água tem sido uma desgraça. A barragem de Alcântara [Espanha] está com 44% da sua capacidade e não tem libertado nada. No troço entre Abrantes e Constância, os agricultores têm tido graves problemas para regar o milho e têm tido quebras de produção muito elevadas”, disse à Lusa o presidente da associação, Luís Damas.

O responsável referiu que se trata de “uma área de cerca de 1.200 hectares afetada pela falta de água” com perdas da ordem dos 30 a 40%, sobretudo na produção de milho, embora culturas de trigo e girassol e zonas de olival, amendoal e macieira também tenham sido atingidas.

“Um hectare que tenha capacidade para produzir 15 ou 16 toneladas está a produzir apenas 10”, quantificou Luís Damas, acrescentando que a falta de água traz outros problemas graves, como o facto de as bombas de água ficarem danificadas por puxarem areia e detritos e terem de ser substituídas.

“Tem sido um inferno, não sabemos a quem recorrer mais”, afirmou.

O líder da associação acrescentou que o Tejo “está um regato, uma autêntica ribeira”, e sublinhou que o vento e o calor dos últimos dias agravaram a situação, “porque os terrenos têm secado muito e os agricultores não conseguem compensar estas condições”.

Luís Damas reafirmou que o problema está identificado há muito e prende-se com a irregularidade do volume de água libertado a partir da barragem de Alcântara, explorada pela empresa elétrica espanhola Iberdrola, que, na sua opinião, “gere os caudais economicamente e não olha para a parte ecológica e tudo o que envolve o rio, nomeadamente a necessidade de ter um caudal com estabilidade, não só por causa da rega, mas também por toda a fauna e flora envolvente”.

“Há um protocolo que define um caudal semanal, mas eles retêm a água e, num dia ou dois, libertam tudo. Queríamos um caudal mínimo diário, mas a solução de fundo era fazer uma barragem no rio Ocreza [afluente do Tejo], que seria um reservatório para não estarmos dependentes de Espanha”, reclamou.

Luís Damas acrescentou que a situação já foi comunicada à Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e à ministra da Agricultura e que recebeu uma resposta do gabinete de Maria do Céu Antunes dizendo que o Governo está atento e a tentar negociar.

“Mas, até agora, nada de concreto”, completou.

Na semana passada, movimento proTEJO exigiu que o Governo recuse a distribuição do caudal mínimo semanal para o rio Tejo acordado com as autoridades espanholas, considerando que se está a “atirar água para os olhos dos portugueses”.

“A proTEJO defende caudais ecológicos no rio Tejo e exige que o Ministério do Ambiente não aceite os falsos caudais diários que apenas satisfazem os interesses das hidroelétricas espanholas”, lia-se numa nota do movimento ambientalista com sede em Vila Nova da Barquinha (Santarém).

Também na semana passada, fonte do Ministério do Ambiente e Ação Climática indicou à Lusa que “Espanha, após conversações com a operadora dos empreendimentos hidroelétricos do Tejo Internacional naquele país, manifestou o seu empenho em distribuir o caudal mínimo semanal da Convenção [de Albufeira] de forma o mais uniforme possível ao longo dos dias da semana”.

Portugal tinha manifestado preocupação com a distribuição diária do volume de água semanal, porque o tratado entre os dois países não prevê volumes diários vinculativos.

Numa reunião realizada em 02 de agosto, que juntou responsáveis da APA e da Direção-Geral de Água de Espanha (DGA), as duas delegações reconheceram que no presente ano hidrológico ambos os países não só cumpriram os regimes de caudais da Convenção de Albufeira, como excederam os volumes estabelecidos na Convenção, que regula as relações luso-espanholas no domínio dos recursos hídricos desde 2000.

Na informação divulgada à Lusa na semana passada afirma-se, no entanto, que “as relativas baixas reservas de água disponíveis nas albufeiras de Espanha apontam para que até final do ano hidrológico [setembro] os volumes a descarregar à entrada de Portugal não serão muito superiores aos caudais mínimos da Convenção de Albufeira”.

As duas delegações, ainda segundo a fonte do Ministério do Ambiente, “acordaram manter o permanente contacto no acompanhamento da situação tendo em vista minimizar os eventuais impactos ambientais e sociais que esta situação de baixos caudais provoca”.

 

Governo de Espanha abre investigação a gestão de barragens no Douro e Tejo

O Ministério para a Transição Ecológica e o Desafio Demográfico abriu investigações às empresas que gerem barragens nas bacias hidrográficas do Douro, Tejo e Miño-Sil, para apurar os respetivos aproveitamentos hidroelétricos.

O secretário de Estado do Ambiente, Hugo Morán, que anunciou as investigações depois de uma reunião com presidentes de câmara afetados pelo esvaziamento da barragem de Ricobayo (Zamora), disse que nestas três demarcações hidrográficas ocorreram níveis de exploração "acima do que seria recomendável".

No caso de Ricobayo, gerido pela Iberdrola, que passou de 95% para 11% em quatro meses, com esvaziamentos especialmente notórios em junho e julho, a coincidir com os preços máximos da eletricidade, Morán indicou que não está em causa apurar só se ultrapassaram os limites da concessão.

Além disso, em concessões com décadas de existência, há que ver "se se superou o que o senso comum recomenda na hora de enfrentar a gestão de um recuso público tão sensível com a água", acrescentou.

Morán afirmou também que há casos em que se abriram investigações não pela exploração hidroelétrica mas por outras razões, recordando que todos os anos, nesta altura, costumam ocorrer "situações de resposta inadequada".

O anúncio de Morán foi feito depois de na semana passada a terceira vice-presidente do governo e titular do Ministério, Teresa Ribera, ter contactado com a Iberdrola devido à redução drástica de água nas barragens de Ricobayo, em Zamora, e Valdecanas, em Cáceres, declarando-se "escandalizada com o que estava a ver".

Avisou na ocasião que, "se se constatar que houve uma má prática" na gestão da barragem vai ser ativado "o mecanismo sancionador correspondente e (aplicadas) as sanções que tenham de ser aplicadas", avisou.

O secretário de Estado do Ambiente ​​​​​​​admitiu que as condições de algumas concessões hidroelétricas foram determinadas quando o impacto das alterações climáticas não era tão visível como é, pelo que os novos planos das bacias hidrográficas vão ser adaptados.

Estes planos estão em discussão pública e devem ser aprovados em meados de 2022.

A Iberdrola garantiu hoje que está a fazer a exploração destas infraestruturas hidráulicas "sempre em contacto com as autoridades competentes".

Depois de o Ministério para a Transição Ecológica e o Desafio Demográfico ter anunciado a abertura das investigações, a Iberdrola assegurou que está a explorar as barragens "dentro dos padrões estabelecidos e com normalidade".

Lusa