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Óbito/Cruzeiro Seixas: A vida como depoimento do último dos surrealistas portugueses

9/11/2020 às 07:35
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Em 1999, doou a totalidade da sua coleção à Fundação Cupertino de Miranda, de Vila Nova de Famalicão, para a constituição do Centro de Estudos do Surrealismo e do Museu do Surrealismo, entretanto criados, existindo hoje o Espaço Cruzeiro Seixas, na Fundação, com uma exposição permanente dedicada ao artista.

Cruzeiro Seixas está representado em coleções públicas e particulares e em museus privados e nacionais, nomeadamente na Caleção Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, no Museu Nacional de Arte Contemporânea - Museu do Chiado e na Biblioteca Nacional, em Lisboa, no Museu Machado de Castro, em Coimbra, na Biblioteca de Tomar e Fundação Cupertino de Miranda, em Vila Nova de Famalicão, entre outras instituições

A estreia do documentário “As Cartas do Rei Artur”, de Cláudia Rita Oliveira, em 2016, o terceiro filme dedicado ao artista plástico, sucedeu-se a “N.O.M.A – Cruzeiro Seixas” (2006), de Carlos Cabral Nunes, e ainda a “Cruzeiro Seixas: O Vício da Liberdade” (2010), de Alberto Serra e Ricardo Espírito Santo.

"As Cartas do rei Artur" resultam de entrevistas a Cruzeiro Seixas, que se cruzam com imagens da sua pintura, dos seus objetos, dos cadernos de anotações e desenhos do autor, num conjunto de testemunhos dos quais emerge, em particular, a relação com Mário Cesariny, que se estendeu por várias décadas, marcada pela amizade, pela paixão e pela rutura.

O filme aborda a homossexualidade de ambos, e a relação de Cruzeiro Seixas com a arte, com a forma de viver de Mário Cesariny e com África, da qual disse ter sido o grande amor de vida.

"Um dos meus suicídios foi em 1975, quando cortei relações com Cesariny", garantiu no filme.

Nas "Cartas de Mário Cesariny para Cruzeiro Seixas", que a Sistema Solar editou em 2016, abrangendo o longo período que vai de agosto de 1941 a dezembro de 1975, é testemunhada a "viagem interior", as "confissões do lado de lá da barricada", as "reflexões, iluminações, relâmpagos, faíscas que nos falam do amor consumado e fugidio e dos sucessivos objetos do desejo", como descreveu então o investigador Perfecto E. Cuadrado, organizador da obra.

A Cruzeiro Seixas dedicou Mário Cesariny alguns dos seus poemas. Mas o artista e a sua obra foi também inspiração para autores como Herberto Helder, Alfredo Margarido, José Pierre, Juan Carlos Valera, Bernardo Pinto de Almeida, Albano Martins, António Barahona, entre outros.

Em 2012, Cruzeiro Seixas foi homenageado pela Feira Internacional do Livro de Santiago do Chile (FILSA), que lhe dedicou um número exclusivo da revista "Derrame", do grupo surrealista chileno. No mesmo ano, recebeu a Medalha de Honra da Sociedade Portuguesa de Autores.

Em 2017, a Bienal de Arte de Vila Nova de Cerveira comemorou os seus 40 anos de existência com uma homenagem ao artista.

Um ano depois, foi Centro Português de Serigrafia, em Lisboa, a recordar o seu percurso, com uma exposição e a edição de um livro com a obra gráfica, a que se seguiria, em 2019, o álbum “Diário não Diário”, com "toda a sua dimensão criativa”.

Entre as suas últimas exposições de Cruzeiro Seixas estão “Colaborativa.mente”, com Valter Hugo Mãe, na Casa da Liberdade - Mário Cesariny, em Lisboa, em 2018, e "Nos Labirintos que Inventei", no Museu do Côa, em 2019.

Em junho do ano passado, associou-se ainda ao lançamento das obras completas de Mário Henrique-Leiria, editadas pela E-Primatur.

No passado mês de setembro, a Perve Galeria, em Lisboa, inaugurou um tributo a Cruzeiro Seixas, para assinalar o centenário do artista.

Pouco depois, em outubro, a ministra da Cultura, Graça Fonseca, entregou a Cruzeiro Seixas a Medalha de Mérito Cultural, como "reconhecimento institucional, mas também como reconhecimento pessoal de alguém que se junta aos muitos que o admiram e que em si encontram um olhar que sempre viu mais longe e mais profundo”.

A entrega realizou-se na Biblioteca nacional de Portugal, que tem patente, até 31 de dezembro, a exposição “O Tempo das Imagens III”, realizada no âmbito do 35.º aniversário do Centro Português de Serigrafia (CPS), que inclui uma sala totalmente dedicada à obra de Cruzeiro Seixas.

Em junho deste ano, foi editado o primeiro de quatro volumes da “Obra Poética”, de Cruzeiro Seixas, no âmbito da coleção "Elogio da Sombra", coordenada por Valter Hugo Mãe, para a Porto Editora, numa recolha organizada pela poetisa e escultora Isabel Meyrelles, outro nome do surrealismo português.

Os três primeiros volumes da obra poética de Cruzeiro Seixas reúnem poemas já publicados, nomeadamente pelas Edições Quási, mas que se encontravam esgotados no mercado, e o quarto, que encerrará o projeto, colige inéditos e dispersos, disse à agência Lusa fonte da editora. O 2.º volume deve chegar à livrarias no final do ano e, o terceiro, “nos inícios de 2021”.

"O pior disparate do mundo de hoje - e Portugal ressente-se muito disso - é as pessoas pensarem que a vida intelectual, a arte, a cultura, são coisas subsidiárias e devem ficar em segundo plano", criticou Cruzeiro Seixas, em entrevista à Lusa, em 2011.

Lusa