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Região: Caçadores defendem que batidas à raposa servem para “equilíbrio” das espécies

3/03/2017 às 00:00
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As batidas à raposa estão em desuso pelo pouco valor comercial das peles ou do interesse pela sua carne, segundo os caçadores de Ortiga, Mação, onde a sua caça é feita para "equilíbrio das espécies" e defesa dos galinheiros.

"A falta de comida nas florestas, como coelhos, lebres e perdizes, leva as raposas a procurar alimento dentro da aldeia causando prejuízos aos proprietários de galinheiros, que só nos últimos dias perderam dezenas de galinhas aqui em Ortiga", disse à agência Lusa o presidente da Associação de Caçadores daquela freguesia do concelho de Mação, no distrito de Santarém.

"São raposas a mais para tão poucos coelhos e no último domingo, a pedido das pessoas lesadas, conseguimos abater cinco raposas num espaço de 800 metros, todas junto das habitações", contou João Durão, para quem a caça à raposa "serve exclusivamente como forma de equilibrar as espécies" existentes na floresta.

"A densidade de raposas aqui é muita e não existe controlo de uma espécie que tem características muito próprias no ataque aos galinheiros, e que são diferentes dos saca-rabos ou das doninhas", observou, tendo feito notar que a raposa, "quando entra no galinheiro, mata tudo e só depois come. Come e leva, ou enterra, para vir mais tarde buscar. Os saca-rabos só matam o que comem, e deixam as carcaças no local, pelo que sabemos diferenciar que tipo de animal ataca os galinheiros".

Segundo aquele caçador, com 30 anos de experiência, "dantes, nos anos 80, as peles valiam dinheiro, cerca de cinco contos cada, mas agora já nem dadas as querem e por isso a população de raposas cresceu muito. E a carne também não é apetecível, pelo que ninguém tem interesse na caça à raposa, mas sim ao javali, esse sim, o pior predador, uma verdadeira praga que devora tudo".

Em Tramagal, no concelho de Abrantes, Vitor Cardoso, caçador há 38 anos, disse à Lusa que ali "não há batidas à raposa porque não existem raposas em excesso", tendo, no entanto, referido que "são vistas dentro da aldeia de Crucifixo", em busca de alimento.

"Há uns anos atrás ainda se fazia um convívio que assinalava o culminar da época de caça com uma batida às raposas, ficando uns com a pele ou com o rabo para troféu. Mas hoje isso já não acontece", afirmou, tendo observado nunca ter "provado" raposa mas que alguns caçadores a faziam de "caldeirada".

Ainda hoje, em Queixoperra, aldeia com 170 habitantes no concelho de Mação, se mantém viva a tradição de confecionar a raposa embora não se façam batidas, que deixaram de ser vistas como "rivais na caça ao coelho e a competir com o homem pelas mesmas presas", disse à Lusa Vasco Marques, 42 anos.

"Toda a minha vida foi feita aqui no campo, numa aldeia rodeada de bosques e ribeiras, e aprendi a viver com as raposas, a conhecê-las e a respeitá-las. São selvagens mas não fazem mal a ninguém e quando se aproximam das aldeias e dos galinheiros é por falta de comida, pelo que, caçá-las, só para controlo e equilíbrio do número de predadores", referiu.

Questionado sobre a tradição da confeção de raposa, Vasco Marques lembrou que "ninguém caça raposas para comer" mas disse que a sua preparação, que aprendeu com o pai e o avô, "requer um tratamento muito especial", tendo referido que "não servem os machos nem as raposas com cio".

Depois de retirada a pele, "têm de estar dois dias mergulhadas em água corrente da ribeira e mais dois dias em vinha de alho, para perder o odor, e depois dá para fazer um petisco saboroso e em convívio, assim como com texugos e ouriços-caixeiros", contou.

Definindo-se como "um caçador que se preocupa mais com as espécies do que coma caça", Vasco Marques disse à Lusa que a manifestação prevista para sábado em Lisboa pela abolição da caça à raposa, em Portugal, "pode ser uma forma de chamar a atenção para as raposas", tendo defendido, no entanto, que "é na destruição do seu habitat e da sua alimentação" que reside o principal problema da espécie, que se alimenta de pequenos roedores, figos e uvas.

"O maior perigo para as raposas e outras espécies é a mudança de hábitos das pessoas e um espaço rural cada vez mais desertificado porque, sem comida, não podem sobreviver", alertou.

Lusa